A reportagem do El País, que eu considero um dos melhores jornais impressos do mundo, foi assinada por Ramon Besa, há anos cobrindo o Barcelona. Por que começo o post desta maneira? Porque ele é baseado em uma declaração não oficial de Messi, supostamente dada a amigos e bancada pelo jornal. Só vale falar sobre o tema se acreditarmos que a informação é verídica e precisa. Eu confio, então vamos nessa.
A frase que Messi teria dito, em um almoço com amigos, sobre Neymar: “Es muy bueno, pero que hable menos de mí, no haga boludeces y diga que viene a por títulos”.
“Ele é muito bom, mas que fale menos de mim, não faça “boludeces” e declare que vem para ganhar títulos”.
Insisto em não traduzir o “boludeces”. O termos é muito, muito usado pelos argentinos e às vezes tem conotação positiva, às vezes negativa. Há muitos palavrões em nossa língua portuguesa que podem ir para os dois lados também, tudo depende do tom de voz, nível de amizade, contexto, etc. Se vocês me pedirem para escolher uma palavra ideal para substituir boludeces eu escolheria “cagada”. Se quisesse ser mais fino, diria bobagem. Mas Messi quer que Neymar não faça cagadas. E uma cagada é mais que uma bobagem, convenhamos. Outra palavra que poderia cair bem seria “idiotices”. Enfim, acho que vocês pegaram a ideia…
Importante: Messi não disse isso publicamente. Não há aqui uma declaração de guerra, crise no Barcelona, nada disso. Por favor, não vamos já colocar Messi como o lobo mau, o argentino que quer ferrar o brasileiro, um invejoso, aquelas coisas de sempre que vemos por aqui quando se quer criar um vilão.
Mas, porém, contudo, no entanto… é algo a se pensar. Neymar chegou ao Barcelona e, em todas as declarações, citou o orgulho de jogar com Messi, a vontade de fazer Messi o melhor do mundo, que Messi isso, Messi aquilo, Messi é lindo, maravilhoso e gostosão. Parece que Messi percebeu o óbvio. Que, por mais que seja verdadeiro, e pode ser que realmente seja, o discurso é pensado e calculado. E já deu.
No momento em até que Johan Cruyff, a eminência parda do Barcelona, coloca em dúvida a boa convivência entre dois jogadores de tal peso no clube, era importante que Neymar chegasse com o discurso da humildade. “Não vim para tomar o espaço de ninguém”. Normal. Foi bem… ele ou quem quer que o tenha orientado.
Mas as semanas passaram e o discurso não mudou, e aí vai cansando. “Pô, amigo, tudo bem que te mandaram falar isso aí, mas já deu. Eu já sei que sou eu quem manda aqui no clube, não precisa mais repetir. Agora o que eu quero é te ver falando no time, falando em ganhar”. É mais ou menos por aí, é essa a interpretação que eu tenho da “confissão” de Messi aos amigos no almoço regado, certamente, a carne e vinho.
Chamo a atenção para as últimas palavras da frase. “Que declare que vem para ganhar títulos”. A exigência pela coletividade. Não importa o eu, o você, o ele, o que importa em um time é o “nós”. É o time. É assim que funciona o Barcelona, é assim que funcionam as equipes de sucesso na história de qualquer esporte coletivo.
Por mais que o nível técnico da liga espanhola esteja despencando com o abismo financeiro entre os clubes, Neymar vai encontrar lá sistemas defensivos mais sólidos e menos espaço. Vai encontrar coisas diferentes, evoluir, aprender. Mas o essencial, o fator preponderante para seu sucesso, é entender que o coletivo é mais importante que o individual. Que o time está acima dele. Que um bom passe é mais valioso e mais bem visto que um drible inútil longe da área.
Quanto mais rápido Neymar entender isso, mais ele vai ganhar espaço. E aí seu talento fará o resto.
A temporada começa com um banco de reservas na estreia, contra o Levante. E daí? Algum problema? Se achar que sim, aí sim há um problema. Se entender que o que importa é o time, é respeitar as decisões do treinador, é ganhar títulos, como disse Messi… aí Neymar não será problema e, sim, solução.
Fonte: Uol