Você já ouviu falar de uma mulher chamada Helena Wright? Ela foi uma
médica humanista envolvida com métodos contraceptivos no início do
século XX, uma época na qual isso era um tabu ainda maior do que ainda é
hoje e, ainda assim, ela não só estudou as relações sexuais e de
reprodução como escreveu livros a respeito e criou centros de
atendimentos dedicados a ajudar todas as pessoas com problemas,
independente de suas classes sociais.
Entre uma consulta e outra, Helena percebeu que havia algo em comum
nos relatos que ouvia de suas pacientes: muitas delas, em vez de
procurarem por meios contraceptivos, queixavam-se a respeito da falta de
apetite sexual de seus maridos, que voltavam da Primeira Guerra Mundial
doentes e traumatizados – isso quando não morriam em combate. Ainda
assim, essas mulheres queriam ter filhos.
Hoje existem algumas maneiras de engravidar sem que, para isso, a
mulher precise estar casada, mas no século XX tais atitudes simplesmente
não existiam, já que “fertilização in vitro” e “banco de
esperma” são nomenclaturas supermodernas. E o que é que poderia ser
feito, então, com relação àquelas mulheres que queriam ter filhos?
Multidão sem parceiro
Helena Fonte da imagem: Reprodução/DailyMail
Os tempos eram realmente difíceis e a Primeira Guerra Mundial, que
teve início em 1914, foi responsável pela morte de milhões de soldados e
civis, sem falar nas pessoas que ficavam muito machucadas, mutiladas e
com traumas psicológicos de proporções realmente grandes. A guerra foi
responsável pela troca de papel de milhares de mulheres, que deixavam o
posto de “esposa” para carregar a tristeza de serem “viúvas” e estarem
entre as estatísticas que as classificava como pertencentes à “multidão
sem parceiro”.
Em 1918, Helena tinha ouvido o relato de milhares de mulheres que,
além de lamentarem a respeito da perda de um marido ou do trauma que ele
havia vivido, falavam sobre o triste destino de passar por isso sem
poder ter filhos. Helena, que já havia vivido na pele o preconceito por
ser médica, tendo que lutar contra a própria família para isso, não se
deixou reprimir e, muito antes do conceito que temos hoje de doador de
sêmen, pensou em como seria possível encontrar um serviço como esses.
O ano de 1919 foi dedicado às pesquisas de Helena, que procurava um
homem que pudesse ser um doador de esperma às muitas mulheres que
queriam, mas não podiam, ainda, ter filhos. O candidato deveria atender a
alguns requisitos básicos: ser alto, ter dentes, ser bem educado,
inteligente e viril.
O doador
Fonte da imagem: Reprodução/Massa-muscular
Entra em cena, então, um homem chamado Derek que, à época, tinha 30
anos e vinha de uma família com pensamentos um pouco mais liberais,
além, é claro, de atender aos requisitos impostos por Helena. Ao
contrário de seu irmão mais novo, Derek não foi convocado a participar
da guerra e, portanto, não viveu os grandes traumas de todos os
soldados, mas experimentou a perda de uma pessoa de sua família, já que o
irmão morreu durante um conflito na Alemanha.
Derek só voltou a se sentir tranquilo quando conheceu uma enfermeira
chamada Suzanne, que viria a ser sua esposa e que, em 1919 o apresentou a
Helena e, à medida que a amizade dos dois crescia, Derek ficou sabendo
que a médica tinha uma lista com pelo menos mil mulheres que gostariam
de ser mães e não tinham como. Foi então que ele entendeu que poderia
ajudar.
Os dois fizeram um acordo em um serviço relativamente secreto que
funcionaria da seguinte forma: cada mulher interessada deveria pagar o
equivalente a 10 libras, sendo que esse dinheiro seria revertido para um
fundo dedicado a prover todos os cuidados pré-natais dos quais as
mulheres e os bebês necessitariam.
O processo
Fonte da imagem: Reprodução/DailyMail
A comunicação entre Helena, Derek e as futuras mamães era feita por
meio de telegramas, e as mulheres não tinham o direito de conhecer o
voluntário com antecedência, para deixar o processo todo mais simples e
rápido. Elas apenas deveriam fazer as contas e ver quais dias estariam
mais férteis para então marcar o encontro. Os maridos eram informados a
respeito e poderiam escolher entre acompanhar as esposas até o local
combinado ou simplesmente ficar longe – a maioria escolhia a segunda
opção.
Derek usava sempre um terno preto, com camisa branca e uma
gravata-borboleta com bolinhas, acompanhado de seu chapéu, uma pequena
maleta e um garrafa de conhaque. A receita dava muito certo e algumas
mulheres chegavam a solicitar uma segunda visita, mas Helena sempre
deixou claro que não se tratava de um tratamento meramente sexual, mas
de uma forma de restabelecer uma família que desejava ter filhos.
Portando, nada de bis.
Resultados
Fonte da imagem: Reprodução/DailyMail
Suzanne, esposa de Derek, de acordo com os relatos de Helena, parecia
ter uma relação boa com a função do marido e não se incomodava com
isso. Durante os próximos anos, Derek visitou mais de 500 mulheres,
sendo que muitas delas chegaram a ter filhos e não precisavam fazer uma
segunda visita ao colaborador. Sempre que uma criança nascia, Helena
enviava um telegrama a Derek. Entre 1919 e 1950, Derek ajudou a conceber
496 filhos.
O colaborador teve também seus próprios filhos – nove, no total – e
morreu em casa, em 1974. Um ano depois de sua morte, surgiram serviços
de homens que se ofereciam para ter relacionamentos curtos com o intuito
de gerar gravidez.
Helena teve uma vida longa e totalmente à frente de seu tempo, sendo
adepta e defensora de relacionamentos abertos, métodos contraceptivos,
abortos e, claro, da ajuda de Derek. Em 1968 ela respondeu judicialmente
por esses atos e foi considerada culpada, mas teve um grande desconto
em sua sentença. Helena conheceu o mundo, ajudou pessoas e contribuiu
para quebrar vários tabus. Ela continuou viajando, estudando,
trabalhando e questionando padrões sociais até o fim de sua vida, que
durou bonitos 93 anos.