Existe uma possibilidade ínfima de você, leitor, saber que o Volkswagen
Gol dos afegãos é o Toyota Corolla. Sim, o mais vendido no Afeganistão é
o Corolla. Branco, de preferência, para evitar que a poeira se
destaque muito. Na Armênia, por exemplo, os Ladas ainda são força
dominante, representantes dos resquícios deixados pela antiga União
Soviética. Você deve estar aí pensando qual é o sentido disso tudo.
Por
que não ter uma visão mais “periférica”, “fora da caixa”? Ao sabermos o
que se passa no mercado automotivo de países fora do eixo temos a
oportunidade de compreender um pouco de outros povos e suas
necessidades, além de entendermos até mesmo o porquê de o Gol ser o
nosso campeão de vendas. Aqui vamos nós dar a volta ao mundo.
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GIRANDO PELO GLOBO O
começo de nossa viagem se dará no mercado africano. Outrora líder
nesse continente, a Peugeot (ao longo dos anos e com “auxílio” das
crises) perdeu espaço para as asiáticas. Especialmente para a Toyota,
que conta com dois contenders de peso que a mantém na liderança
inquestionável do território. Eles são os indefectíveis Hilux e
Corolla. Estima-se que a caminhonete média seja campeã de vendas em
mais de 20 países da África e o “coroa de flores” seja o líder em pelo
menos nove nações da mesma região geográfica.
Na Índia, o Suzuki Alto atrai pelo custo de manutenção e consumo |
Por
que tal estimativa e por que de a Toyota ser uma força dessa
magnitude? Nosso “consultor” nos respondeu. Matthias Gasnier, francês
radicado na Austrália, é dono do Best Selling Cars (bestsellingcarsblog.com),
espaço na internet no qual ele divulga os veículos mais vendidos dos
países dentro e fora do eixo – por meio de minuciosas pesquisas,
coletas de dados e observações dele mesmo e de colaboradores. Ele já
viajou para vários pontos inóspitos do mundo a fim de obter informações
sobre tais mercados. O próprio Gasnier considera seu hobby excêntrico,
mas, depois do alcance atingido pelo site, percebeu que muitos
partilham dessa curiosidade.
“Considerava meu hobby muito esquisito. No entanto, depois da criação
do blog vi que milhões de pessoas ao redor do mundo tinham o mesmo
interesse que eu. Ou seja, a coisa não é tão estranha assim”, brinca o
intrépido pesquisador. Quanto ao domínio absoluto da Toyota na África,
Matthias explica: “A Toyota jamais negligenciou mercados em quaisquer
partes do mundo e é raro uma montadora fazer o mesmo. Geralmente elas
focam em regiões nas quais são mais fortes, mas a Toyota jamais pensou
dessa maneira. Por isso ela está presente não somente na África, mas
também na Ásia Central e com representatividade na América do Sul e
Oceania”, comentou.
NO BRASIL? Assim como a
Toyota não renegou mercados considerados “alternativos” à época, a
Volkswagen não negligenciou o mercado brasileiro. Muito pelo
empreendedorismo do falecido Wolfgang Sauer, a montadora alemã
conseguiu construir uma dinastia que já dura anos no país. Apesar de
não ser a fabricante que mais vende carros no Brasil, seu modelo é
ícone e sua liderança é incontestável. O Gol está enraizado no
inconsciente do consumidor tupiniquim.
“De maneira similar com
que a Toyota atuou em outras partes do mundo, a VW fez o mesmo no
Brasil. O emocional conta muito na compra de um veículo e a Volks
conseguiu, atuando como uma montadora local, incuir isso no
inconsciente dos brasileiros”, analisa Gasnier. Nota curiosa? No
Afeganistão o Corolla é tão popular (ele atende por 80% da frota do
país) e tão emocionalmente ligado aos seus admiradores que os afegãos
chegam a colar adesivos com inscrições como: “Eu amo meu Corolla”,
“Super-sedã Corolla” e “Corolla, eu te amo”.
ÁREA DOS LADAS Desde
os idos da União Soviética, a AvtoVAZ, popularmente conhecida como
Lada, é figurinha carimbada no Leste europeu. O icônico 2105,
comercializado no Brasil sob a alcunha de Laika, é presença certa nas
ex-Repúblicas soviéticas. No entanto, fabricantes chinesas como a Great
Wall e a Geely já calcificam sua presença na região. Aliás, a última,
vez ou outra, abocanha a primeira colocação em vendagens na Ucrânia, por
exemplo.
Mesmo assim a Lada segue. Na Rússia, o Granta virou a
nova “mania nacional”. O carro, voltado para os jovens (sim, para os
jovens) e com custo baixo para a população russa, é o novo hit da Lada e
terminou o ano de 2012 na liderança de vendas. Sem contar que, nos
seis primeiros meses deste ano, o Granta vendeu 84.261 unidades,
garantindo 6,3% de participação no mercado russo.
Enquanto muitos torcem o nariz pelo Brasil, Chery QQ é o mais vendido em Myanmar |
POR AÍ
O Chery QQ, graças à frota de táxis formada por ele, é o campeão de
vendas em Myanmar, nação fronteiriça à Índia e Bangladesh. Na Índia, em
julho, o Alto —fabricado pela Maruti, subsidiária da Suzuki naquele
país —liderou com 18.206 unidades comercializadas. O kei car se adapta
com maestria às condições de dirigibilidade das ruas indianas. De baixo
custo e econômico, é prato cheio para os consumidores.
Consumidores
que, na Holanda, demonstram que segurança é o que conta. Pela primeira
vez o Volvo V40 lidera um ranking nacional. O modelo vendeu 1.616
unidades e bateu Renault Clio e VW Golf. Em Moçambique o subcompacto
Kia Rio é grande destaque, ao lado do Chevrolet Aveo e do indefectível
Toyota Hilux. Já no Líbano, os Kias Cerato e Picanto são fáceis de
serem encontrados nas ruas.
Na Holanda, segurança é o fundamental: Volvo V40 lidera vendas |
Para
fechar, no Vietnã o Toyota Fortuner, vulgo SW4, é absoluto. Num
mercado no qual, em média, há menos de um carro novo por habitante
(apenas 80 mil unidades foram vendidas em 2012), Nguyen Lac pode se
considerar um sortudo. Proprietário de um Fortuner, o engenheiro está
muito feliz. “Não poderia pedir veículo melhor para rodar em nossas
vias. Foi uma excelente aquisição. Pena que poucos podem partilhar
deste luxo, mas o mercado vietnamita está florescendo e meus
compatriotas desfrutem do mesmo que eu”, diz Lac. O PIB per capita do
Vietnã sofreu aumento considerável nos últimos anos, mas o país ainda é
apenas o 130º no ranking do Fundo Monetário Internacional (FMI)
divulgado em 2011.
FUTUROLOGIA Ao ser indagado
sobre o futuro do mercado automotivo, Matthias Gasnier crava: “Poucas
fabricantes chinesas vão perdurar, mas essas entrarão para valer em
países considerados periféricos, agindo da mesma forma que a Toyota.
Além disso, prevejo que a Hyundai, devido ao seu estilo de marketing,
seja uma das três maiores montadoras do mundo em alguns anos”. É, se
esses resultados se concretizarão, ninguém sabe, mas vale a pena
continuar a conferir a ciranda mundial desse belo advento que nos
apaixona tanto chamado carro.
O Toyota SW4 vira Fortuner no Vietnã e é destaque naquele país |